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Anticorpos monoclonais no tratamento da infecção pelo COVID-19: Tocilizumabe e Sarilumabe.

Grupo Farmacologia Informa


A busca por terapias eficazes para tratar e/ou prevenir a COVID-19 continua sendo realizada pela comunidade científica (1). A doença causada pelo SARS-CoV-2 está associada a uma resposta imune desregulada e a uma resposta inflamatória exacerbada (hiperinflamação), o que ocasiona a síndrome do desconforto agudo respiratório, além da falência dos órgãos. A gravidade da doença está relacionada ao que chamam de “tempestade de citocinas” e dentro desse contexto, a interleucina-6 (IL-6) tornou-se um biomarcador muito importante (1). A elevação IL-6 está relacionada a casos mais graves da COVID-19, incluindo uma alta probabilidade do uso de ventilação mecânica (2). Dessa forma, estudos com anticorpos, como o tocilizumabe e o sarilumabe, que bloqueiam o receptor da IL-6 impedindo seus efeitos biológicos, estão sendo realizados.

O tocilizumabe é um anticorpo monoclonal humanizado e começou a ser comercializado no Japão em 2008 para tratar a doença de Castleman (um tipo de tumor benigno). Em 2010/2011 passou a ser usado para tratar também a artrite reumatoide na União Europeia e nos Estados Unidos (1). No tratamento da COVID-19, espera-se que seu efeito seja benéfico no controle da “tempestade de citocinas” comum na doença (1). Para entender melhor o seu mecanismo de ação, releia nosso texto anterior (https://www.farmacologiainforma.com/post/evid%C3%AAncias-atuais-sobre-o-uso-de-tocilizumabe-na-covid-19).

Um estudo randomizado, duplo-cego, controlado por placebo avaliou 377 participantes e mostrou que o tocilizumabe pode beneficiar pacientes que tenham doença moderada a grave reduzindo a probabilidade de um desfecho composto por progressão para ventilação mecânica ou morte, além de potencializar o tratamento com o antiviral remdesevir ou com glicocorticoides (2). Após alguns ensaios clínicos comprovarem a redução na mortalidade e a especificidade na patogênese em pacientes com COVID-19, a Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos aprovou o uso do tocilizumabe para tratar pacientes hospitalizados nesses graus (3). No entanto, existem muitas variações nas atuais recomendações entre os países a respeito do uso do tocilizumabe na COVID-19, o que torna claro a necessidade de mais ensaios clínicos com este medicamento.

O sarilumabe é um anticorpo monoclonal totalmente humano, e o fato de ser uma imunoglobulina humana faz com que ele ofereça um risco menor de produção de anticorpos neutralizantes, maior afinidade ao receptor da IL-6 comparado ao tocilizumabe e menor risco de reações alérgicas (1). Este anticorpo foi aprovado em 2017 no Canadá inicialmente para tratar a artrite reumatoide, sendo seu mecanismo de ação semelhante ao do tocilizumabe (1).

Os dados sobre o uso do sarilumabe no tratamento da COVID-19 ainda são bastante limitados. Um estudo clínico de coorte foi realizado na Itália com 56 pacientes com pneumonia grave e hiperinflamação, onde 28 pacientes receberam infusão intravenosa de 400 mg de sarilumabe além do tratamento padrão (incluindo hidroxicloroquina 400 mg, azitromicina 500 mg, darunavir 800 mg, cobicistate 150 mg e enoxaparina 100 U por kg) e 28 receberam apenas o tratamento padrão. O tempo até a morte, tempo para resolução de febre e tempo para normalização do biomarcador inflamatório PCR (proteína C-reativa) foi significativamente menor nos pacientes que foram tratados com sarilumabe. No entanto, não houve diferenças significativas relacionadas a trombose pulmonar e infecção entre os dois grupos (4).

O Grupo de Trabalho de Avaliação Rápida de Evidências da Organização Mundial de Saúde (OMS) para Terapias COVID-19 (REACT) avaliou vários ensaios clínicos que abordavam a associação de antagonistas da IL-6, como o sarilumabe e o tocilizumabe, e a mortalidade na COVID-19. Eles concluíram que o tratamento com medicamentos antagonistas da IL-6 associados a corticosteroides oferecem uma maior melhora clínica quando comparado a qualquer outro medicamento administrado de forma individual (5).

As recomendações no protocolo brasileiro consideram o uso de tocilizumabe como um tratamento farmacológico adicional em pacientes que fizeram uso recente de cateter nasal de alto fluxo (CNAF) ou de ventilação não invasiva (VNI) em uma dose única de 8 mg/kg intravenosa. Já o sarilumabe não foi aprovado ainda para uso, mas os estudos clínicos já foram autorizados pela ANVISA (6).

A OMS incluiu os bloqueadores do receptor de IL-6 nas suas diretrizes do tratamento da COVID-19, especialmente quando associado a corticosteroides. Essa mudança foi baseada em uma meta-análise considerando mais de 10.000 pacientes e 27 ensaios clínicos, sendo estes os primeiros medicamentos considerados eficazes contra a COVID-19 desde a recomendação dos corticosteroides (7).

Ainda se faz necessário o desenvolvimento de mais estudos que abordem ambos os medicamentos, mas é possível notar que tratamentos com bloqueadores do receptor de IL-6 vêm se destacando e se mostrando eficazes. Na plataforma clinicaltrials.gov encontramos 27 estudos que avaliavam o tocilizumabe na COVID-19 com status concluído e 57 estudos em andamento (8). Também encontramos 6 estudos que avaliavam o sarilumabe na COVID-19 com status concluído e 10 estudos em andamento (9).

GLOSSÁRIO

Biomarcador: Indicador que pode ser avaliado para detectar a severidade ou presença de algum estado de doença.

Anticorpo humanizado: São anticorpos que não procedem de espécies humanas, mas têm suas sequências proteicas modificadas para se tornar mais semelhantes aos que são produzidos naturalmente pelo corpo humano.

Anticorpo monoclonal: Anticorpos idênticos entre si e que reconhecem especificamente um sítio de ligação. Os humanizados produzidos em espécies não humanas.

Estudo de coorte clínico: É um estudo observacional onde os indivíduos são selecionados pelo seu status de exposição (expostos e não expostos), sendo observados na busca por avaliar a incidência da doença em um período de tempo.

Meta-análise: É uma técnica estatística usada para agrupar resultados de dois ou mais estudos que são independentes, mas abordam a mesma questão.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Silva DL, et al. Uso de fármacos anticorpos monoclonais, imunomoduladores e anti-inflamatórios no tratamento da infecção por COVID-19. Revista da Sociedade Brasileira de Clínica Médica. 2020;18(1):55-68.

2. Salama, Carlos, et al. “Tocilizumab in Patients Hospitalized with Covid-19 Pneumonia”. New England Journal of Medicine , vol. 384, nº 1, janeiro de 2021, p. 20-30. Taylor e Francis + NEJM , https://doi.org/10.1056/NEJMoa2030340.

3. Parums D. V. (2021). Editorial: Tocilizumab, a Humanized Therapeutic IL-6 Receptor (IL-6R) Monoclonal Antibody, and Future Combination Therapies for Severe COVID-19. Medical science monitor : international medical journal of experimental and clinical research, 27, e933973. https://doi.org/10.12659/MSM.933973

4. Khiali, Sajad, et al. “A Comprehensive Review on Sarilumab in COVID-19”. Expert Opinion on Biological Therapy, vol. 21, nº 5, maio de 2021, p. 615–26. DOI.org (Crossref) , https://doi.org/10.1080/14712598.2021.1847269.

5. WHO Rapid Evidence Appraisal for COVID-19 Therapies (REACT) Working Group et al. “Association Between Administration of IL-6 Antagonists and Mortality Among Patients Hospitalized for COVID-19: A Meta-analysis.” JAMA vol. 326,6 (2021): 499-518. doi:10.1001/jama.2021.11330

6. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Relatório Conitec nº 638: Diretrizes Brasileiras para Tratamento Hospitalar do Paciente com COVID-19 – Capítulo 2: Tratamento Medicamentoso. 2021. Acessado em 09 de setembro de 2021. Disponível em: <http://conitec.gov.br/images/Relatorios/DiretrizesBrasileiras_TratamentoHospitalarPaciente_CapII.pdf>

7. WHO Recommends Life-Saving Interleukin-6 Receptor Blockers for COVID-19 and Urges Producers to Join Efforts to Rapidly Increase Access. https://www.who.int/news/item/06-07-2021-who-recommends-life-saving-interleukin-6-receptor-blockers-for-covid-19-and-urges-producers-to-join-efforts-to-rapidly-increase-access. Acessado 09 de setembro de 2021.

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