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Uso de lopinavir/ritonavir no tratamento da infecção pelo novo coronavírus

Grupo Farmacologia Informa


Muitos fármacos já aprovados para outros tipos de infecções virais vêm sendo estudados para o tratamento da COVID-19, causada pelo novo coronavírus SARS-CoV-2. Dentre eles inclui-se a combinação de lopinavir/ritonavir, que são fármacos inibidores de protease (enzima essencial para a produção de partículas virais infecciosas e maduras) originalmente utilizados no tratamento da infecção por HIV (vírus da imunodeficiência humana), em combinação com outros antirretrovirais (1). Essa combinação é utilizada porque o metabolismo do lopinavir é altamente inibido pelo ritonavir, prolongando assim a permanência do lopinavir no organismo (2).

Lopinavir/ritonavir mostraram efeito inibitório contra o SARS-CoV-1 em estudos realizados em células (3,4). Além disso, dois relatos de casos para tratamento da síndrome respiratória do Oriente Médio causada por coronavírus (MERS-CoV) mostraram que esses dois fármacos associados com o antiviral ribavirina e com interferon-α resultaram na sobrevivência dos pacientes (5,6). Recentemente foi mostrada a atividade antiviral do lopinavir contra o SARS-CoV-2 em células (7,8).

Foi realizado um estudo randomizado controlado com 199 pacientes adultos hospitalizados em Wuhan/China, utilizando a combinação lopinavir/ritonavir para tratamento de infecção por SARS-CoV-2 (9). Não foi observada redução da mortalidade nem alteração da carga viral no grupo tratado comparado ao grupo não tratado (controle), e o tempo para melhora clínica foi reduzido em apenas 1 dia. O tratamento foi interrompido em 13,8 % dos pacientes devido a efeitos adversos, principalmente gastrointestinais. No entanto, como este estudo apresenta algumas limitações em relação aos grupos de pacientes e análise dos dados, novos estudos são necessários para avaliar a eficácia do lopinavir/ritonavir (10,11). Um relato de dois casos de pacientes com pneumonia leve por COVID-19, em Taiwan, indicou que o tratamento com lopinavir/ritonavir não reduziu o tempo de infecção pelo SARS-CoV-2 (12).

Outro ensaio clínico randomizado multicêntrico realizado com pacientes internados com COVID-19, em Hong Kong/China (13), comparou a combinação lopinavir/ritonavir + ribavirina + interferon β-1b (86 pacientes) com lopinavir/ritonavir (grupo controle, 41 pacientes). Os efeitos adversos de náuseas e diarreia foram similares entre os grupos e não houve nenhum óbito. A terapia antiviral tripla precoce foi segura e superior ao grupo controle com relação ao alívio dos sintomas e tempo de internação hospitalar em casos leves a moderados. Os autores citam a necessidade de estudo com a combinação lopinavir/ritonavir + interferon β-1b.

Um estudo retrospectivo mostrou que a combinação de lopinavir/ritonavir com arbidol (antiviral) resultou em conversão negativa para SARS-CoV-2 (não detecção do vírus em exame laboratorial) mais rápida e melhora das alterações pulmonares (14).

Estudos sobre a farmacocinética do lopinavir em pacientes com COVID-19 indicam que estes pacientes apresentam concentrações plasmáticas deste fármaco bem superiores àquelas observadas em pacientes com infecção por HIV. Isto pode estar relacionado às alterações hepáticas associadas à COVID-19 (15), que levariam a uma redução do metabolismo do lopinavir (16,17). Assim, os próximos estudos também devem investigar possíveis ajustes da dose deste fármaco.

Apesar da eficácia do lopinavir/ritonavir no tratamento da COVID-19 ainda não estar bem estabelecida, uma revisão sistemática sobre os tratamentos utilizados nos primeiros 9152 casos reportados de COVID-19 mostrou que esta combinação foi o tratamento mais frequentemente utilizado (18). As Diretrizes para o Tratamento Farmacológico da COVID-19 publicada pelo Consenso da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, da Sociedade Brasileira de Infectologia e da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (19) e as Diretrizes para Diagnóstico e Tratamento da COVID-19 do Ministério da Saúde do Brasil (20) sugerem não utilizar lopinavir/ritonavir de rotina no tratamento da COVID-19.

Outros 60 ensaios clínicos com lopinavir/ritonavir no tratamento de COVID-19 estão em andamento (21). Um estudo avaliando a comparação entre lopinavir/ritonavir e hidroxicloroquina em pacientes com infecção leve por COVID-19 foi finalizado, mas os dados ainda não publicados. Até o momento, não há vacina nem medicamento específico para prevenir ou tratar a COVID-19.




Referências

1. Benson CA, et al. Safety and antiviral activity at 48 weeks of lopinavir/ritonavir plus nevirapine and 2 nucleoside reversetranscriptase inhibitors in human immunodeficiency virus type 1-infected protease inhibitor experienced patients, J Infect Dis 2002; 185(5): 599-607.

2. Corbett AH, et al. Kaletra (lopinavir/ritonavir). Ann Pharmacother 2002; 36 (7-8): 1193-1203.

3. Chu CM, et al. Role of lopinavir/ritonavir in the treatment of SARS: initial virological and clinical findings. Thorax 2004; 59: 252-256.

4. Chen F, et al. In vitro susceptibility of 10 clinical isolates of SARS coronavirus to selected antiviral compounds. J Clin Virol 2004; 31: 69-75.

5. Kim UJ, et al. Combination therapy with lopinavir/ritonavir, ribavirin and interferon-α for Middle East respiratory syndrome. Antivir Ther 2016; 21: 455-459.

6. Spanakis N, et al. Virological and serological analysis of a recent Middle East respiratory syndrome coronavirus infection case on a triple combination antiviral regimen. Int J Antimicrob Agents 2014; 44: 528-32.

7. Kang CK, et al. In vitro activity of lopinavir/ritonavir and hydroxychloroquine against severe acute respiratory syndrome coronavirus 2 at concentrations achievable by usual doses. Korean J Intern Med 2020; May 29. doi: 10.3904/kjim.2020.157.

8. Choy K, et al. Remdesivir, lopinavir, emetine, and homoharringtonine inhibit SARS-CoV-2replication in vitro. Antiviral Res 2020; 178:104786.

10. Kunz KM, et al. A Trial of Lopinavir-Ritonavir in Covid-19. N Engl J Med 2020; 382(21):e68.

11. Carmona-Bayonas C, et al. A Trial of Lopinavir-Ritonavir in Covid-19. N Engl J Med 2020; 382(21):e68.

12. Cheng CY, et al. Lopinavir/ritonavir did not shorten the duration of SARS CoV-2 shedding in patients with mild pneumonia in Taiwan. J Microbiol Immunol Infect 2020;S1684-1182(20)30092-X.

13. Hung I F-N, et al. Triple combination of interferon beta-1b, lopinavir–ritonavir,

and ribavirin in the treatment of patients admitted to hospital with COVID-19: an open-label, randomised, phase 2 trial. The Lancet 2020 May 8; S0140-6736(20)31042-4.

14. Deng L, et al. Arbidol combined with LPV/r versus LPV/r alone against Corona Virus Disease 2019: A retrospective cohort study. J Infect 2020; S0163-4453(20)30113-4.

15. Zhang C, et al. Liver injury in COVID-19: management and challenges. Lancet Gastroenterol Hepatol 2020; 5: 428–30.

16. Baldelli S. Lopinavir/ritonavir in COVID-19 patients: maybe yes, but at what dose? J Antimicrob Chemother 2020; dkaa190. doi: 10.1093/jac/dkaa190.

17. Gregoire M. Lopinavir pharmacokinetics in COVID-19 patients. J Antimicrob Chemother 2020; dkaa195. doi: 10.1093/jac/dkaa195.

18. Fajgenbaum DC, et al. Treatments Administered to the First 9152 Reported

Cases of COVID-19: A Systematic Review. Infect Dis Ther 2020; May 27;1-15. doi: 10.1007/s40121-020-00303-8.

19.Falavigna M et al. Diretrizes para o Tratamento Farmacológico da COVID-19. Consenso da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, da Sociedade Brasileira de Infectologia e da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, 18 de maio de 2020.

20. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde – SCTIE. Diretrizes para Diagnóstico e Tratamento da Covid-19. Versão 3. 17 de abril de 2020.

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